Cassete


Eu tenho vinte facas a cruzar-me o peito, o teu corpo colado ao meu em cada movimento, a tua alma a trespassar a minha, de trás para a frente e a cortar-me o espírito em pedaços que são mais eu do que eu própria sou agora. Eu respiro e sufoco, eu escrevo e sufoco, eu vivo e sufoco. Como se fosses tu também os meus pulmões. E sinto-me despida. A exposição a que me submeti, todas as partes de mim que eu nunca escondi, o mais íntimo e ínfimo de mim que só tu conheces querem desintegrar-se na formação de uma nova pessoa para te esquecer. É um erro que alguém nos leia como pessoas mais vezes do que nós próprios nos vimos ao espelho. Meu deus, meu deus, eu amo-te. Há mais de cinco anos que te amo. Há mais de um ano que sofro da tua falta. Sinto-me martirizada por te ter conhecido e mesmo que eu goste de ter este grande amor, há mais sangue do que lágrimas, há mais dor do que corpo e há mais de ti em mim do que a matéria que me compõe. Eu preciso de voltar a Londres. Assim que possa. No Inverno. Ainda há gatos e não sei se ainda tens medo deles mas sempre que vou apanhar o comboio ao Domingo lembro-me de quando me levavas a casa e agora lembro-me que se não te tenho, não tenho lugar. Merda. O teu nome tem nome de amor. E desgosto. E carnificina. E ópera. Fantasmas, sombras e danças. E tu assombras-me. Eu tenho vinte fantasmas a viver dentro de mim e hoje tornei-me num deles. 

4 comentários:

  1. deixas-me sempre de coração nas mãos!

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  2. Às vezes pergunto-me como consegue o amor dar vida e, ao mesmo tempo, matar. Que esses fantasmas se esfumem e tu renasças das cinzas, fénix das palavras bonitas.

    r: Infelizmente ainda nunca andei no metro de Londres mas um dia, quando por lá andar, espero sentir essa magia que falaste.

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  3. Não és fantasma, nunca serás. Porque por muito que sejas névoa nunca serás apenas fumo, apenas nada. Tens em ti mais conteúdo do que julgas, muito conteúdo para além do Miguel, que ainda me lembro de ser tema de conversa. Não penses que serás toda a vida dele, ou o terás sempre em ti. É mentira. Mas também acho -se me é permitido achar o que quer que seja-, acho que precisas de certos pontos para certos is, colocados pessoalmente, mesmo que afiados como facas, mesmo que por vezes dilacerem pensamentos e vidas. Nunca nada te vai desfazer.

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  4. Se calhar, razão parcial porque as nossas histórias se espelham é uma parecença de espírito que me soa existir entre o Miguel e o Mickael. Dois mundos de aventuras, amor, coisas novas, coisas bonitas - e uma morte para cada uma de nós. Uma morte que, tem dias, me sabe bem e outros que me faz desejar não fosse só parcial. Para bem dos nossos pecados, mortes assim não são senão convites a renascimentos. Quando queima assim, a fénix regressa sempre mais bonita.

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