Onde estás?


A mulher a quem tu dizias amar não existe mais. Os encantos visíveis das pessoas são sempre realçados por aqueles que ainda estão por revelar. Mas por saber tantas coisas de trás para a frente, como o facto de gostares de beijos no pescoço, por exemplo, tomou a opção de desistir de tudo aquilo que ela conhecia. De ti. A vida é assim mesmo, feita de ciclos. Tu pudeste ver o pior dela. Quanto a deixaste ela partiu-se em lugares que nem ela sabia que existiam. Conheceu o mundo que lhe mostraste e jurou nunca mais voltar lá. Olhas para ela e tens essa mesma sensação, que já não a conheces. Não te inibes de pensar que a causa és tu mas aquilo que mais te incomoda é que há tanto que ela não te contou que nunca saberás afinal porque escolheu não olhar para ti. Eu sei que ela jurou nunca desistir de nada. Mas pela primeira vez ela desistiu. Para ela foi uma comédia. Todas aquelas fases que descrevem em gramática. Desde a tua perda acompanhada de ruína à clarividência do sol que ela apreciou mais no dia que escolheu, em êxtase, que independentemente daquilo que ela mais quisesse de ti, tinha que seguir em frente. Curioso esse termo, porque a verdade é que talvez nunca supere o facto de também ela te ter abandonado. Desistiu. De ti. Eu sei que ela jurou nunca desistir de alguém que amasse, mas os cigarros sabem melhor que tu e o sabor a álcool deixou-a mais lúcida do que alguma vez a tua presença o poderá fazer. A prova é que ela já nem quer estar ao teu lado. Tu próprio podes admitir que te perseguiu e não te preocupes que não te desmente. Mas essa mulher não é esta de que eu te falo. Já ouviste falar muito de como as mulheres decidem, no entanto, te garanto que não há pessoa mais capaz de dizer "não" do que esta. É por isso que teve medo de o dizer tanto tempo. Mais do que aquilo que te possa dizer, tu sabes que "não" é sempre o mais complicado de dizer para quem não tem medo da vida. E depois do medo que lhe deste, ela não podia ser tua. Talvez queiras matá-la, talvez queiras nunca a ter conhecido para que não te consuma a alma de arrependimento. Ou remorso. Mas se ainda quiseres desse jeito, morta, é porque a amas. Mas ela não é mais capaz de te dar isso de volta. Duvidas que alguma vez o tenha feito, tão poucas foram às vezes que a ouviste dizer, mas ela tem um acordo, assinado por todas as pessoas que ela consegue ser, para não o fazer. E a mulher que tu amas devia ser capaz disso não é? Talvez a mulher que ela é agora consiga, talvez não, o relevante é mesmo saberes que não há nada que possas fazer para voltar atrás. Não se abandona ninguém neste mundo, às vezes ficamos com aqueles que amamos, às vezes só não estamos ao lado deles, mas depois existem aquelas raras pessoas no mundo que se desapegam. Não, não como se o mundo fosse delas e elas dispusessem, mas porque elas mesmas pertencem aquilo a que pessoas como tu chamam de países e continentes. Ela apreciava-te a coragem de bastantes coisas, de dizeres aquilo que gostas em voz alta, coisa que não se sente capaz de fazer nunca, mas o que ela nunca pôde apreciar foi a falta de coragem para seres tu mesmo porque ela sempre foi ela mesma. Quando não te amava, quando o fazia e especialmente quando o deixou de fazer. Mas para quê falar-te de uma pessoa que não conheces se tu não queres conhecer. Deste-lhe medo porque tinhas medo. E convínhamos que a tua cobardia sempre foi ser igual a ela, com sensações de perda, de maus amores, de passados mal resolvidos, sem nunca lhe dizeres. Bem afinal ela sempre te disse, mas agora que ela mesmo é uma história mal resolvida tua - se assim se pode dizer - o que vais fazer? Pois é porque se o quiseres mesmo saber, sabe primeiro que a mulher que tu conheces não existe e não sei se precisas de mais uma na tua vida, mesmo que esta seja aquela que tu sempre e realmente quiseste. Mesmo que esta, para lá dos papéis que tenha, te ame em todas as formas que assume, porque a forma que ela tem agora não se permite a deixar que entres outra vez na vida dela. E procures o que procurares tu sabes que nunca tiveste mulher - no verdadeiro sentido da palavra - nenhuma e é isso que te dói. Ela dói-te. 

5 comentários:

  1. Este teu texto disse-me muito. Também em temos alguém julgou amar-me. Na verdade limitou-se a amar uma mulher que não existia. Ou seja, nunca chegou a amar.

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  2. sou da opinião que escrever nunca é um erro. nem que escrevamos a maior porcaria de sempre, se for o que nos vai cá dentro, é a maior cena de sempre.
    e este texto...já sabes o que penso dele :)

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  3. Palavras para quê? Perdem sem dar conta.. O melhor que tiveram.

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  4. obrigada Raquel, a sério! obrigada vezes mil. nunca imaginei há uns anos quando comecei a escrever mais a sério que iria receber comentários assim, sabes? e se eu pensava que não precisava da opinião dos outros para me sentir bem com a minha escrita, enganei-me. a opinião dos outros também alimenta a minha escrita. não só os bons comentários, mas também os duros. e agradeço-te por isso. por me dares vontade de escrever mais e mais sempre que me comentas um texto

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