Vícios


Tentando colocar-me no teu lugar, rasguei todas as folhas que nunca te escrevi. E rasguei o meu coração por não entender como cheguei a este lugar. Voltei a escrever vezes sem conta e apaguei. Voltei a tentar. Tentar pensar como tu e o que te passou pela cabeça para me parares no tempo, para me roubares do meu tempo. Eu já nem era daqui mesmo. Era de outra era onde sentir me coincide totalmente com o pensamento. E pensar haveria sempre ser a minha melhor forma de expressar o que sinto. Nunca poderias saber e tu ensinaste-me e eu permiti-me dizer as coisas em voz alta. O tecto branco que guarda os meus segredos, os cigarros que fumo como se me fossem consumir a alma também e o que bebo para te esquecer, nada mudou o facto de eu nunca mais poder ter aqui. E o meu orgulho como o meu escudo. Mas se eu pudesse ter-te outra vez, de tantas vezes que me disseram que era errado, eu não poderia. Eu não saberia amar-te mas mostraria-te que tudo o que guardamos nunca ninguém vai ter porque eu amei-te com o tudo o que não tinha. Aprendi a ter calma e achava que um dia tudo ia fazer sentido. Algo que não podia controlar, algo que eu não podia respirar sem que me fizesse ficar sem ar, um dia ia fazer sentido. Que um dia eu e tu íamos poder contar isso tudo e que mesmo que nos encontrássemos noutros lugares e noutras pessoas, mesmo que nos perdêssemos de nós mesmos, tu escolherias sempre voltar. E tu nunca voltas-te. E eu nunca esperei. Nunca fui capaz de te fazer ficar e nunca fui capaz de me fazer ficar em nenhum segredo. Mas no dia que decidi que não podia olhar mais para ti, foi o dia em que mais te senti. E não gosto de sentir. Ainda me dói com tanta força. Ainda me custa a falar. Ainda não suporto ouvir a tua voz. Ainda não suporto saber sobre ti. Ainda me custa andar nas mesmas ruas que tu. E vai sempre custar-me os caminhos que faço até casa. Espero sempre que todos os passos que dou me levem para longe de ti e em cada centímetro que faço tento aceitar que nunca te vou perceber. Os teus erros que não parecem por mal. O teu mal que nunca é o meu bem. E quando dou por mim já não estou a andar em direcção nenhuma, não percorri nada e como se algo tivesse ficado por dizer, eu não consigo deixar-te e fico cada vez mais parada no tempo. Talvez o meu mal sejas tu e este vício que eu tenho de ti, com a certeza que apesar disso, eu não tentei tudo o que podia para ficar contigo mas estava tão cansada que não conseguia dormir de noite com medo de sonhar e tão apática que nem todas as drogas do mundo podiam resolver a minha saudade. Essa que nunca soubeste que eu tinha de ti todos os dias, a todas as horas. Essa que eu estraguei em palavras vazias de significado. E essas em que eu devia ter ido atrás de ti fosse onde fosse que estivesses. Mas quanto mais montava as peças mais tu me parecias afastar de ti e a cada segundo que passava habituei-me tanto a não te ter que achava que não queria mais. E se fui cega, não fui surda. Ouvi toda a gente que me dizia para correr dali e como se isto fosse um jogo, eu escolhi perder. E desde então perco tudo. E acho que até a mim me perdi. Em todas as tuas partes que eu não pode ter, em todas as coisas que eu gostava de ter tido contigo, em todos os momentos em que me custa admitir que eu não estava preparada e, no entanto, talvez por isso mesmo te vá amar por mais tempo. Não sei por mais quanto. De quantas maneiras. E podias ter-me levado tudo, podias ter-me levado pedaços, mil lágrimas em vez de mil sorrisos, mas deixas-me bem e deste-me coragem para ficar sem ti. E despedimos-nos tanto rápido que corro o risco de nunca quebrar com isto. Com medo de me quebrar a mim junto com a esperança de esquecer tudo sem que me magoe, sem que me custe. E ainda que nunca vá poder explicar o que fui, o que foste e o porquê de nos cruzarmos na vida um do outro, explico-te que faça o que fizer, só espero que as nossas acções encontrem descanso em sentir que nada disto foi em vão e que um dia isto nos sirva para saber que amar vai ser sempre a dor mais feliz do mundo. Tão feliz como seremos, cada um na sua estrada. Porque eu fiz as malas e o que te prometi e não cumpri, não o faço a mais ninguém. E não, não são os textos que me vão curar. Eu nunca me vou curar de ti nem dos meus outros vícios.

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