Surpresa


Descobrindo o prazer que é não te lembrar da mesma maneira, vou apagando a tua cara e vou apagando o resto da minha vontade de a querer ver. Dizem que quando não vemos, não sentimos. Se fossemos corações. Mas não somos e nunca fomos. Fomos pele e vontades. Fomos palavras e vazios. Um dia até lamentei não ser a verdadeira pele que te ocupava, dominada pela vontade que sempre tive de estar ao teu lado para poder ouvir da tua voz as palavras que me escrevias. Acho que esperei e cansei-me de esperar. Acho que é impossível ter tanto amor em tão pouco tempo, porque estava a descobrir o prazer que era ter desejo para dar e receber. Mas vou apagando o teu rosto. A luz suave a beijar-te os olhos que não querem abrir, os meus dedos no mais carnudo da tua face. Vou indo, caminhando em ruas iluminadas pela lua. Vou indo, para longe de ti, ao mesmo passo que sempre quis ter contigo e nunca tive, devagar. Descobrindo o que é não te ter, descobrindo o que é descobrir que não te amo mais. Ou que te amo devagar e sem querer chegar. Questionei-me tantas vezes no que fui eu cair e quando eu entendi que até o que eu sentia não podia ser remediado, quando assentei os pés no chão para dizer que chegava de perseguir desejos e vontades, questionei-me se te amava, se te amei e disseram-me com a maior certeza do mundo que tu não amas na dúvida. Sabes, eles não me conhecem. Tu também não. Porque saberiam que eu amo tudo o que seja inconstância e perguntas e foi nesses termos que escolhi entregar-me ao gosto de te amar. Mas não posso deixar de concordar que tens de questionar a falta de saudade, a falta de borboletas, a falta de querer saber. O gosto de amar que se tornou amargo demais e não como um chocolate negro que te vai fazendo bem apesar disso. Tudo o que vivi contigo foi virar o mundo do avesso. O mais comum dos humanos sabe que não se pode amar aquilo que não se compreende, tão exactamente como amor não é esse fascínio. E é impossível amar à velocidade das estações, quatro vezes ao ano, quando provavelmente sabes que não amaste realmente nada nesse tempo. Mas descobrir-te foi como as mudanças na natureza que não conseguimos evitar. Tempestade. Tempestades. E depois a bonança até o dia em que te possa ver como um coração que já não sabe sentir. E nesse tempo todo que passe perceba que podem existir quantas teorias houverem, há pouca paixão por aí e infelizmente tu fostes uma delas. Mas eu ainda estou a descobrir-me, para perceber se afinal nada disto foi amor. 

1 comentário:

  1. os ornatos vão ser sempre uma das melhores bandas portuguesas que existiu, para mim :)

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