Não confundir


Vou acreditar que as cartas sem destinatário, algures no caos que é o universo, de alguma forma, chegam onde devem chegar. Dá-me alento para as palavras que ficaram perdidas ao chegar até ti. Gostava de conversar contigo enquanto dava conta de um maço e de uns copos de vinho tinto, fico-me por um ou dois cigarros e resto da minha natural inconsciência, de forma escrita. Penso em ti ao final do dia sempre como uma incongruência de seres mais uma das coisas que deixei por fazer, castigo de seres mais uma coisa que quase fiz. Fazer-te é o verbo correcto quando sinto esta saudade, ridícula perante o facto de nunca ter vivido verdadeiramente na tua presença, correcta porque te imagino. As minhas palavras são simples de perceber, dão facilmente a entender que me sinto petrificada nas tuas respostas, muito mais na ausência delas. Por isso, não te falo. Não sei como encarar a clareza com atacas os meus desejos, tudo o que reprimo em mim como errado e para o qual tu tens sempre ou compreensão ou uma falta tão grande de sanidade como eu. Sempre fui sincera no meu egoísmo, egocentrismo, no sentido de me sentir especial e ainda assim tão normal no que toca ao teu nome. O teu nome que devia ter iniciado tantas cartas e que não o fez precisamente porque ainda me acho no direito de não ter a primeira palavra. É por medo, confesso. Com medo de me afogar, com medo de me prender mais uma vez na maneira como sabes cantar aos segredos da minha mente. Acho que me tornas mais louca, agindo como uma provocação ao que eu acho que não devo fazer. Desafias-me e é impressionante como apesar de não me fazer falta o jogo que me apresentas, eu deixo sempre desafiar-me. Talvez devesse ser grata por me fazeres sair de uns quantos princípios que eu sempre tive como correctos, e ainda que distante, sinto que acompanhas os meus passos quando tomo um primeiro ou quando corro o risco. Tens uma premeditação qualquer para aparecer, para existir, quando eu já quase te esqueci. Parece que adivinhas quando vou e vais-me sempre deixando ficar. Ou não. Não porque eu estou aqui e tu aí e não há contacto. Não somos humanos nem perto de pessoas quando nos escondemos um do outro. Quase que gostava de tudo em ti e só tenho pena que não queiras ser tudo o que podias ser, preso aos teus medos como eu aos meus. Eu também te escapo pelas mãos eu sei, mas sabes porque não foi mais e porque não foi melhor? Porque nunca tivemos a mesma morada, porque nunca quisemos os mesmos lugares, porque nunca quisemos as mesmas pessoas e por fim porque nem eu nem tu quisemos estar um com o outro. É complicado demais de tão simples que é, encontrei-te e desejei sempre encontrar alguém como tu, tive medo e por hoje e por amanhã cansei-me de te escrever para apagar, porque foste tu que nunca, em primeiro lugar, tiveste disponível para aceitar os erros com que escrevo. E eu culpo-te por isso, quero que saibas que te culpo por isso. Por isso não volto a gostar de ti, ficas aqui. Nas cartas e nas memórias que eu nunca tive contigo. Ah, isso e porque tu que me dás nojo. 

5 comentários:

  1. Uma linda postagem com dizeres sinceros e profundos...

    Que este fim de semana os teus olhos brilhem com o resplendor de quem viu o sonho mais difícil ser concretizado!
    bj de carinho no coração.

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  2. A capacidade de ter as palavras na mão é maravilhosa. Fiquei a morar por uns instante nas tuas palavras para um eu que não quis viver contigo. Lindo!

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  3. Obrigada, Raquel. De certa forma sinto que tenho que te agradecer porque estás a estar presente. E isso é motivo de força para mim. Espero que a resposta chegue rápido porque a angústia de não saber onde estou não é boa.

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  4. Escreves tão bem sobre amor e desamor. Sobre ficção e realidade. Escreves tão bem! Sempre que te leio fico maravilhada :)

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